Desgraças de rico que são muito chiques
Pobre é escandaloso por natureza, pois aprende desde cedo que se ele não gritar, ninguém escuta. Portanto uma habilidade que eu sempre admirei no rico é a elegância. Rico sabe ser elegante inclusive na hora da desgraça, diferente do pobre, que se em situações normais já é escandaloso, na hora do aperto grita mais que cantor sertanejo.
Aqui nesse post vou listar situações desastrosas na vida dos ricos que são encaradas por eles com muita elegância:
1. Velório
Velório de rico é a coisa mais chique do mundo. Nunca fui em um, mas já vi na TV.
Todo mundo de preto, roupas elegantérrimas, óculos escuros e o principal: silêncio. As pessoas choram pra dentro, e colocam o lenço embaixo dos óculos para secar a lágrima que nem caiu ou, o mais provável, fingir que tava secando uma lágrima quando na verdade nem chorando tava, mas sabe que precisa fingir tristeza.
As pessoas falam baixo. Quem chega ao velório se dirige vagarosamente até os parentes do falecido, mexe rapidamente a boca dizendo alguma palavra de conforto, seguido de um abraço fraterno. Em seguida essa pessoa se afasta e fica junto dos demais respeitando, elegantemente e silenciosamente, todo aquele sofrimento.
Muuuuuuito diferente é o velório do pobre.
Primeiro que na saída de casa é preciso ensinar pra tia Carmen que o correto é dizer “meus pêsames”, e não “meus pensamentos” como ela pensava que era. Entram 6 parentes em um Uno 98 prata e partem rumo ao velório municipal.
Se no velório do rico a família cumprimenta quem chega com silêncio e discrição, no velório do pobre ao ver a amiga chegando a esposa do morto já manda logo o:
– Ai, Cleusa! Cumé que eu vou fazê agora sem o Ademar?
Tem choro generalizado e, durante a choradeira, tia Carmen não encontra momento oportuno para dizer os “meus pêsames” que tanto ensaiou.
Depois de cumprimentar a viúva o pobre se afasta, mas não para permanecer em silêncio, e sim para ir até outro pobre que está com um copinho descartável de café na mão e dizer:
– Esse café cê pegou onde?
E lá vai ele atrás do café e biscoito que ele já saiu de casa pensando em comer.
Quem não tá triste também não finge que tá triste, pelo contrário, vai lá pra fora do velório fazer piada sobre o morto e dar risada.
– Só morta mesmo pra Tia Elza calar a boca, ein, Alixandre?
E caem na gargalhada.
Na hora do enterro o cortejo rico segue em silêncio, elegantes, com seus ternos pretos mesmo que esteja um dia quente. Já no velório pobre é uma choradeira, rezação, gente cantando músicas de igreja, todo mundo suando horrores e uns 4 ficando pelo caminho pois desmaiaram devido a queda de pressão causada pelo calor.
2. Ser preso
A prisão do rico é toda chique. Primeiro que ela acontece em etapas: antes da prisão vem o mandado de busca e apreensão, que é quando a Polícia Federal bate na casa do investigado pra dizer que precisa recolher alguns objetos.
O rico, como manda o “Manual do rico investigado”, é obrigado a fazer ao policial a seguinte pergunta:
– O senhor tem mandado?
O policial confirma e então o rico, com o c* na mão, mas sempre mantendo a elegância, deixa o policial adentrar.
Dias depois da busca e apreensão é que vem a prisão. 6 da manhã a Federal para na porta da mansão com 18 viaturas, descem delas agentes musculosos, bem trajados e usando óculos escuros de marca, batem à porta e anunciam ao rico que ele está preso.
Mais uma vez, seguindo o “Manual do rico investigado”, o rico precisa dizer:
– Deve estar havendo algum engano.
Ao passo que ouve do policial que não há engano nenhum.
O rico ganha então autorização para trocar de roupa e não ser preso trajando seu pijama de seda. Instantes depois ele sai de sua mansão ou prédio em bairro de luxo, raramente algemado, vestindo blazer, camisa social, calça jeans e sapato, de semblante sério, cabeça erguida, seguido pelos agentes galãs e sendo fotografado por diversos veículos de imprensa importantes. Ele é colocado no banco de trás de uma Pajero da PF, chiquérrima, preta com os escritos dourados, tendo ainda a ajuda do policial que põe a mão em sua cabeça para impedir que ele bata a cabeça no carro.
Muuuuuuito diferente é a prisão do pobre.
Na prisão do pobre não tem Pajero, não tem policial com óculos de marca e nem imprensa. Tem 1 Pálio 2001 da Polícia Militar e 2 PM’s, que não usam óculos pois sabem que, na luta corporal inevitável com o pobre, os óculos certamente se danificariam.
O pobre não é preso de cabeça erguida, pelo contrário, ele resiste bravamente, esperneia e grita, enquanto a cunhada diz:
– Calma, Cláudio. Cláudio, calma.
E o policial antes de entrar em embate ainda tenta contornar a situação:
– Seu Cláudio, colabora com a gente que é melhor pro senhor. Sai daí, seu Cláudio.
Esse lugar que o policial pede pro Cláudio sair geralmente é o telhado da casa, que o Cláudio subiu pra não ser alcançado.
Mas não tem jeito, Cláudio é pego na base da força, algemado e colocado aos berros no camburão, sem nenhuma elegância. Não tem blazer, camisa social e sapato. Tem chinelo havaiana azul com branco, bermuda e a camisa de vereador que rasgou no embate com a polícia.
Imprensa? Não tem. Tem os vizinhos fofoqueiros que vão contar da prisão do Cláudio cada um à sua maneira. E como quem conta um conto aumenta um ponto, até o final do dia vão dizer que eram 5 viaturas, 45 policiais e que aparentemente o Cláudio tava envolvido com o Fernandinho Beira-Mar.
3. Ser afastado do cargo
Pobre quando faz merda é demitido, mas esse termo nem é utilizado, já que os mais usados são “mandado embora” ou “ir pro olho da rua”. Ele sai da empresa furioso prometendo pra Deus e o mundo que vai levar o patrão no pau, que é o termo pobre pra “entrar na justiça”.
Muuuuuuito diferente é o rico.
Rico faz merda, vai preso pela PF, mas não é demitido, é afastado do cargo, afastamento esse que é acompanhado de outra coisa muito chique: nota emitida pela empresa do rico à imprensa dizendo que a empresa está “colaborando com as investigações” e que “Carlos Rodolpho Menegotti permanecerá afastado até a conclusão das investigações”.
Muuuuuuuuito diferente é o pobre.
Pobre não é afastado e não emite nota à imprensa, ele é mandado embora e envia áudio pros ex-colegas de serviço mais chegados no Whatsapp que começa com “foi muita sacanagi o que fizero comigo lá na empresa” e termina com “mas eu já falei com o meu advogado”, o que claramente é mentira porque pobre não tem advogado, tem no máximo um primo que cursou direito mas hoje trabalha mesmo é com instalação de internet em residências.
4. Ter áudio vazado.
Esse, pra mim, é o mais chique. Acontece quando alguém consegue interceptar uma ligação de um rico, sempre muito importante e decisiva para a nação. A ligação imediatamente cai nas mãos da imprensa, que a transmite o áudio no jornal com aquela arte de sempre, com foto e nome dos dois envolvidos, do lado de dois balõezinhos onde são transcritos os diálogos. Sempre coisas grandes como:
– Tô preocupado com essa busca da PF na minha casa, Tarcísio.
– Relaxa, eu conheço um delegado forte, vou falar com ele.
Muuuuuuito diferente é o áudio vazado do pobre.
Quando vaza áudio de pobre é o quê? É a muié reclamando pra Neiva que o crush só tinha o sinarzinho, é o torcedor puto da vida porque o atacante Deivid entrou com um processo contra o Cruzeiro sendo que o Deivid não fez 1 gol sequer no campeonato inteiro, ou uma senhora perguntando quanto fica pra botar na casa dela internet com radiador.
Essa é, ao meu ver, a principal diferença cultural entre o rico e o pobre. O rico é ensinado que, haja o que houver, deve preservar a sua imagem. O pobre é ensinado que, haja o que houver, não deve levar desaforo pra casa, o que justifica o pobre sempre agir como se o mundo fosse acabar ontem.